quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Irmãos: simplesmente amem-se!

Começou assim:
_ Oi, vim pra ficar com você.
_ Que bom! e depois de um gemido: Estou sentindo muita dor, da outra vez não foi assim, esta dor está muito forte.
Lá estava eu, sozinha com minha irmã grávida se contorcendo numa cama de hospital no vai e vem das assustadoras contrações. Assustada, eis o adjetivo exato para definir o meu estado ao ver minha irmã se revirando de dor e não poder fazer absolutamente nada mais do que chamar a enfermeira incansavelmente, e também um adjetivo perfeito para definir o estado da minha irmã no momento em que seu segundo filho resolveu vir ao mundo, pois mais de uma vez ela disse: “da outra vez não foi assim, está doendo muito...”. Eu, que tinha uma visão romântica sobre partos, me deparei com uma dolorosa realidade. E enquanto fiquei ali tentando acalmar minha irmã, ofereci minha mão para ser apertada no momento em que a dor a açoitava, com a outra mão senti seu suor frio na testa e me pus a rezar, pedindo a Deus que o bebê viesse rápido para a dor ir embora, mas que desse saúde aos dois no momento decisivo, para que depois do vendaval, ambos pudessem aproveitar o sábado de sol que fazia fora do ambiente gélido do hospital.

Momentos angustiantes depois vi minha irmã seguir para receber seu bebê e nos quarenta minutos aflitivos que se seguiram mal consegui me concentrar nos meus pedidos a Deus, só fiz lembrar, e lembrar me fez compreender que o tempo é realmente um senhor poderoso, é o fogo transformando alimentos dentro de nós, alimentos chamados sentimentos.
As lembranças, seres alados, me carregaram para um passeio entre diversos momentos da minha convivência com minha irmã. Posso me ver ali criança: tímida, magrela, retraída, à sombra da irmã mais nova: linda, mais alta, carismática, engraçada, com uma vivacidade constante atraindo todas as atenções. Já então me perguntava como dois seres tão diferentes poderiam ter sido provenientes de uma mesma mãe? Já na adolescência refiz inúmeras vezes essa pergunta e não conseguia avistar nem um lampejo de resposta. A adolescência só piorou as coisas entre nós, havia uma competição velada. Ela continuou cada vez mais linda, adquiriu bem cedo um corpo escultural de mulher e continuou atraindo todas as atenções. Eu que queria meu espaço, resolvi abandonar a posição de sombra e lutei com as armas que me foram oferecidas: estudo. As comparações eram inevitáveis: “uma é mais bonita, mas a outra é mais inteligente, não, uma é mais espontânea e divertida, a outra é muito certinha” e dá-lhe brigas! Pois, por mais que as comparações viessem de fora, por sermos tão diferentes, usávamos nossas fortalezas para metralhar as fraquezas uma da outra e assim passaram-se anos em que lutamos numa arena imaginária, definindo irmãs como oponentes.
Quero dizer ao tempo que muito agradecida estou agora por ver que o fogo, embora aparentasse fraco, cozinhou na medida certa nossos sentimentos. Hoje vejo quanto tempo perdemos brigando, como não soubemos conviver com a diferença tão aparente e tão presente entre nós. Porque há um ditado que diz que se os dedos de uma mão não são iguais, por que os irmãos deveriam ser todos iguais? A graça está exatamente no movimento que a diferença promove. Se todos os dedos fossem completamente idênticos, talvez algumas tarefas não seriam cumpridas com louvor e embora diferentes, oferecem um perfeito encaixe. É aí que mora a beleza da diferença: o ajuste entre as partes na realização de um objetivo. Ninguém cresce com pessoas iguais a si, o crescimento está naquilo que o diferente impulsiona, na maneira como reagimos àquilo que foge do nosso panorama de correto, de bom, de bonito. Por isso julgamos tanto nossos irmãos, porque a diferença existente neles não é aceita por nós como natural, mas como algo que irrita fácil, que promove a discórdia inútil. Mas se observássemos mais os dedos, entenderíamos que a diferença deles é o encantamento da mão. A convivência com irmãos é a primeira prova da vida em sociedade e se são eles que foram destinados a ser parte da nossa vida, queiramos ou não, a convivência, esta arte de viver junto, precisa ser vivida de maneira saudável, mesmo que tardiamente.
Se eu pudesse dar uma dica somente aos irmãos que não se compreendem, eu diria: “Irmãos, simplesmente amem-se! Amem-se enquanto ainda é tempo!”. Demorei a entender, mas hoje sei que minha irmã, ou também meu irmão, poderá, em algum momento, me decepcionar ou me ferir. Mas também sei que poderei fazer isto a eles, e sei, mais ainda, que em algum momento eu precisarei de algum deles e certamente, sem pedir, eles me estenderão a mão, a mesma mão que tem dedos tão diferentes e se completam...
Terminou assim:
_ Vou embora agora porque vou à missa.
_ Reza pra mim?
_ Rezo sim, mas não precisa pedir, você sempre esteve nas minhas orações.
Saí do hospital chorando, primeiro de tristeza porque meu sobrinho teve complicações de respiração e ficou hospitalizado. Segundo, de alegria porque finalmente compreendi a importância do tempo, a alegria de ser irmã e ter irmãos, e principalmente o valor da diferença.

Polliana Dias