quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Sobre frutos e pedradas

Kalil Gibran é um sábio escritor libanês falecido em 1931, porém, como os sábios e como os escritores, deixou um legado de valor intelectual incalculável. Eu não o conhecia, embora seja uma admiradora incansável de literatura, jamais havia lido nada de sua autoria, tão pouco ao seu respeito. Mas a vida conhece meios ignorados e surpreendentes de nos mostrar novidades, isto é, quando estamos com o espírito disposto a aceitar o desconhecido para evoluir. Tenho um colega de trabalho, um jovem senhor muito culto e também muito sábio, que fez a gentileza de me presentear com um livro deste autor: O Profeta. Este livro deve ser o mais conhecido de Gibran devido à sabedoria que emana das palavras gravadas nele, é um livro simplesmente encantador. Tempos mais tarde, este mesmo colega de trabalho, o Sr. Antônio de Pádua, meu vizinho de mesa, me presenteou com outro livro de Gibran, este contém os mais belos pensamentos do autor, lá li uma frase impactante que guardei num canto especial da minha memória, parece que estava prevendo que em algum momento ela me seria muito valiosa.
Há momentos na vida em que sentimos que tudo é luta, tudo é dor, tudo é sofrimento. É como se de repente a vida dissesse: “a hora do recreio acabou”, então ela aperta aquela sirene furiosa e começa a etapa de provações. É dada a largada então para uma avaliação pesada, um intenso vestibular da sobrevivência, várias provas de uma só vez, não há tempo para decidir qual delas fazer, todas precisam ser resolvidas, muitas vezes sem cola, sem ajuda de professor, sem a certeza de uma recuperação mais tarde caso haja uma bomba. Quando esses momentos chegam, o sentimento é de total impotência e desespero, é como se todos os problemas encharcassem todos os sonhos que vão ficando miúdos a ponto de escorregarem para um bueiro escuro. A enxurrada de acontecimentos ruins é capaz de fazer desmoronar tijolos e tijolos de batalha que estavam empilhados esperando pelo cimento de boas notícias. Foi num desses momentos de tormenta, em que vi muitos tijolos jogados ao chão, alguns quebrados, outros lascados, que a frase de Kalil Gibran ressoou na minha mente: “Somente as árvores que têm frutos são sacudidas e apedrejadas em busca de alimento”, ela está no livro “Os mais belos pensamentos de Gibran”, e refletiu esperança em meio ao caos.
É uma bela metáfora. A árvore que não dá frutos nem é notada, tão pouco é procurada, salvo quando o momento é de procura por uma sombra, mas é um momento passageiro, porque o sol muda de posição e a sombra pode não servir por muito tempo. Mas a árvore que produz frutos é vigiada enquanto floresce, quando começa dar os primeiros sinais de frutos já é cobiçada, quando os frutos aparecem então, não duram muito tempo. Assim, no momento nublado pelo qual passava, quando a visão fica turva por causa da tempestade, quando o desespero rouba o sorriso do rosto, quando o choro representa a dor de ver sonhos perdidos, esta frase trouxe um raio de sol e mudou todo o cenário. Através dela percebi que o apedrejamento que tantas vezes sofro, o qual será contínuo, faz com que o melhor de mim venha à tona. As pedradas são as decepções, os vários “nãos” que recebo quando espero um sim, os elogios e o reconhecimento que quase sempre não chegam, enfim, tudo isso faz com que meus frutos caíam quando recebo este saculejo, e se este saculejo acontece é para me deixar ativa no grande processo natural de evolução. Aprendemos muito mais num momento ruim, produzimos muito mais num momento de crise do que num momento de total plenitude. A vida quer nossos frutos, quer o melhor que pudermos oferecer, os frutos são a certeza do movimento, é um degrau na escada do crescimento. Acredito que quantos mais frutos retirarem de mim e a minha reação para com elas, minhas atitudes para com sua caída, serão os passos decisivos rumo à grande estrada da sabedoria. Sabedoria essa que Kalil Gibran esbanja em suas palavras.
A vida é movimento e nos movimentos da vida os frutos nascem, e em algum momento eles serão retirados de nós para produzir alimento, é uma rotação dolorida, mas edificante. Há uma canção interpretada pela Maria Bethânia, escrita por Guilherme Arantes, intitulada de Brincar de Viver, que dialoga com este texto, cujo refrão diz: “Você verá que é mesmo assim / que a história não tem fim / continua sempre que você responde sim / à sua imaginação / a arte de sorrir / cada vez que o mundo diz não.” Como eu disse antes, a vida conhece maneiras surpreendentes de nos fazer evoluir.

Polliana Dias Ferreira
06/12/2009

2 comentários:

  1. Em uma expressão mais "rude":
    A àrvore que dá mais frutos é a que mais é apedrejada.
    Muito bom adorei o texto... Continue assim... Você vai longe bunitinha....

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  2. Muiiito bomm
    na vida temos muiitos momentos assim
    refleti bastante com o comentário
    "faz com que o melhor de mim venha à tona"
    muitas vezes damos nosso melhor e parece q nem
    estivemos lá....
    parabéns linda...

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